segunda-feira, 22 de novembro de 2021

MINHA BISAVÓ CECÍLIA. 

 
MINHA BISAVÓ CECÍLIA. 

MissãoVelha-CE, 22 de novembro de 1906, na casa de Manoel Privado Marques, dona Maria Alexandria, sua esposa, dá a luz para mais uma menina. Como se chamaria? Dona Alexandrina: "hoje é dia de Santa Cecília, Cecília será seu nome". Dona Genoveva, avó da recem-nascida diz: "oh minha filha, toda Cecília é sofredora. Mas não se apoquente: vamos no Juazeiro pra padre Cícero batizar e tudo se resolve".

Veio a seca de 1915, o sol rachou o chão do Cariri e a irmã caçula de Cecília morreu de fome e desnutrição. O pai desolado, reuniu a família e parentes, foram tomar bênção ao padim Ciço no Juazeiro, encontraram Lampião e Maria Bonita pelo caminho e depois seguiram para o Maranhão, andando a pé durante 48 dias e 49 noites, feito bando de ciganos, fugindo da seca e da fome.

Com pouco mais de 6 anos Cecília registrou todos esses acontecimentos na memória que, desde então, ficou apurada até os últimos instantes de sua vida, em 2006. No tempo que não tinha HD, ninguém a superava na capacidade de gravar datas, nomes, acontecimentos e tudo em quanto, vírgula por vírgula: legado que sua genética transmitiu aos descendentes que, até hoje, não tem nenhum que sofra de Alzheimer.

Uma mulher forte e valente que enfrentou a seca, aparando as próprias lágrimas para irrigar suas esperanças. Deu a luz a 10 filhos, enterrou 7, ficou viúva cedo. Criou filhos, netos, sobrinhos e afiliados que cruzaram seu caminho. Seu neto Manoel (meu pai) era seu chodo, talvez por ter o nome do seu velho pai, até que eu nasci e o destronei, kkkk.

O tempo marca 115 anos de seu nascimento. Brotam saudades, lembranças palpitam o coração e com a memória precisa que herdei, volto no tempo e vou ao seu quarto tomar bênção. Vejo a cama a direita, uma rede de fios, armada por cima, tecida a mão com uma varanda rica de detalhes. Fito a janela em frente a porta, sopra o vento; volto-me à cômoda cheia de perfumes, brincos e fivelas, posta a minha esquerda.

Detenho a vista por uns instantes naqueles utensílios da vaidade feminina. Levanto a vista e leio, com nitidez, num quadro com uma paisagem de flores: "Aquilo que nos separa não destrua o que nos une."

Parabéns vovó Cecília.

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