sexta-feira, 11 de maio de 2012

Uma ode alusurense de saudade


Saudade... Palavra suave de doce pronúncia que, as vezes, trás pitadas de amarga desilusão que tempera o viver com sabor impar que o paladar dos dias revela-se impotente em descrever. Saudade é abraço com gosto de despedida e ao mesmo tempo esperança que crepita no intimo do ser uma alegria-confiança de viver/sentir algo bom, cuja continuidade o decurso do tempo se encarregou de interromper provisória ou definitivamente.


Saudade doe e às vezes até pode matar. De todos os suplícios este seja talvez o mais belo, sublime e divino, contudo morrer de saudade também é um martírio horrível e uma lastimável maneira da vida humana definhar-se, mas ao final dessas realidades contraditórias, paradoxais, antagônicas... Morrer de saudade é uma maneira sutil de contemplar o infinito que se condensa na limitada debilidade das dimensões corpóreas da existência humana, a qual nesse mister, se lança ao infinito para tentar buscar alivio à agonia risonha de um sorrateiro sucumbir de forças que quanto mais se definham mais fortes ficam.

De fato, não é difícil compreender porque saudade é palavra exclusiva da língua portuguesa, uma palavra que não possui correspondente em outras línguas, ou seja, não pode ser traduzida e isso ocorre haja vista que essa palavra não é a definição de algo, mas sim o resultado da confluência de vários sentimentos que se condensam de forma tão consistente que não é possível distinguir um do outro, tampouco o início de um e o final de outro nesse emaranhado de sensações que o coração pulsante sente, porém o intelecto não podendo explicar, apenas tenta expressar na singeleza de sete letras que submetidas ao plural o extasiam naquele infinito que lhe proporciona alivio e que, nesse viés, ganha por sinônimo a efusão de oito letras: “saudades”.

Hoje, uma efusão de saudades faz deste dia o ponto de partida para um morrer de saudade de maneira mais intensa com o paradoxal gosto de despedida e alegre-confiança. No decorrer das horas a lembrança de Cecília Marques é para mim a tradução mais fidedigna de saudade e a recordação de tudo que representa a mais perfeita expressão da elevação de saudade ao plural existencial de poder conhecer seres especiais epla maneira humana de ser.

Para mim, saudade hoje tem o gosto salgado de lágrimas involuntárias e arredias que afloram ante o horizonte feito confissionario dessas emoções que o peito arrebata e a alma dilacera na inexorável angustia-alivio que esse sentimento causa. A angústia fica por conta da dura certeza cada dia mais inclemente e crua da separação fisica e da ausência presencial cada vez mais contundente e inquestionável; já o alívio fica por conta da certeza de que passe o tempo que passar sempre existira saudade-esperança dos dias risonhos vividos ao lado de alguém sem precedentes de bondade em circunstâncias idênticas de tempo, lugar e condições.

Nesse sorrateiro abraço de saudade, a lembrança aporta em Missão Velha-CE no dia 22/11/1906 e após segue para Juazeiro-CE em 1915 saindo de lá no mesmo ano para o Maranhão, mais especificamente por Pedreiras, depois Pinheiro até encerrar essa viagem em 11 de maio de 2006 em São Luís do Maranhão. Nos caminhos dessa viagem fica o rastro de uma mulher forte e destemida que acuda pela seca partiu do Ceará sem jamais esquecer suas origens ou deixar de cultuar o jeito cearense de viver; fica também o rosário de netos, bisnetos e afilhados; fica também o sorriso meigo e encantador, a simpatia de uma personalidade carismática e a gentileza da simplicidade de uma mulher inesquecível.

Acima de tudo fica a saudade e saudade não se explica, apenas se senti, se culrtiva e, cultivando-se, morre-se de saudades durante toda a vida, em cada instante de lucidez ou loucura porque saudade é a antagônica experiência de estando vivo morrer em todo instante da inenarrável aventura de viver e conviver ajuntando centelhas de infinito que intangível semeia e a criatura humana faz fecundar ao construir recordações e colher lembranças que se fazem indeléveis, assim como a primavera que se pereniza mesmo quando chega o outono graças a saudade.

Querida vovó (bisavó) Cecília, quantas saudades imensas de você!