Com singular esmero o dia de São João, foi
preparado na paróquia de mesmo nome, cuja Matriz – tangenciada pela Rua da Paz
– fica no coração do Centro de São Luís do Maranhão.
A secular imagem do padroeiro foi descida
do altar-mor, para veneração dos fiéis, durante toda a novena preparatória e o
pároco cumpriu com maestria o encargo que lhe compete, sobremaneira nas
homilias, proferidas com uma magnitude que revelam seu empenho para com o
festejo.
O ano de 2015 para aquela comunidade
ganhou um brilho todo especial, realçado pelo deslumbre de uma emoção: transpor
a soleira do tempo que assinala a passagem dos 350 anos da edificação daquele templo
consagrado a Deus, pela fé, e também, pela devoção, a São João Batista.
Ao longo de mais de três séculos quantas
marcas, quantas lembranças e quantos acontecimentos: o templo que nasceu de uma
promessa, projetado para ser uma capela, tornou-se igreja matriz. Para
assinalar a passagem dos 350 anos da edificação religiosa, a missa de São João
teve toda solenidade; o renomado coral São João – assim chamado porque germinou
entre as paredes daquela casa de oração – altaneiro ergueu a voz para louvar a
Deus entoando as mais belas músicas sacras durante a missa, homenageando aquele
lugar bendito onde começou dar seus primeiros passos.
Os sinos da igreja erigida em 1665,
entretanto, por razões que acredito decorrerem de manutenção da infra-estrutura
secular, não tocaram com o vigor de antes: desafiar a passagem dos séculos é
algo que exige manutenção e, lamentavelmente, vivemos em uma época de muita
insensibilidade, sobretudo das autoridades, para com a preservação cultural e
ambiental.
Um dos sinos da torre estava posto no chão
da igreja matriz e não dobrou festivo quando o andor com a imagem do precursor
de Cristo saiu em procissão, mas para a ausência do badalar de sinos,
concorreram os fiéis com caloroso aplauso e dada a quantidade de pessoas, aqui e
acolá ouvia-se, bela e fervorosamente, irromper em alta voz: “ viva São João;
Viva!” A fé fez as vezes dos sinos e ignorou a circunstância imposta pelo
transcurso de quase quatro séculos.
São João Batista era filho Santa Isabel, prima
da Virgem Maria, tia de Jesus e sobrinha de Sant’Ana. Portanto, Sant’Ana era
tia de Santa Isabel e tia-avó de São João. Por isso mesmo, mereceu singular
tratamento a passagem da procissão diante das Igrejas de Nossa Senhora do Carmo
e de Sant’Ana. Em ambas as igrejas os sinos dobraram retumbantes tão logo a
procissão por elas passava e, na porta de ambas, o andar de São João parou, sendo
que na Igreja de Sant’Ana demorou-se um pouco mais: tempo suficiente para rezar
um Pai-nosso e algumas Ave-Marias.
Finda a procissão, movida pela fé – aquela
mesma que move montanhas – outra vez ecoou imensa salva de palmas quando o
andor com a imagem de São João Batista subiu a escadaria da igreja de que é
patrono.
No alto da escadaria, outra vez a imagem foi
volvida para o povo que, aglomerado na pequenina praça, empunhava nas mãos as
velas – já abaixo da metade – levadas durante o cortejo de fé. A pedido do
pároco, Pe. Heitor, um enorme e imenso silêncio fez-se ouvir nas imediações da
igreja e nele a prece silenciosa de cada um foi dirigida a Deus pela
intercessão de São João; um silêncio altivo e vibrante de uma sonoridade
estridente.
Para a adversidade advinda do descaso do
Poder Público que não disponibilizou meios para que de modo mais belo se
realizasse aquele ato de fé – que também se traduz em uma das manifestações
mais caras da cultura ludovicense e maranhense – socorreu a gratidão de muitos
devotos, pelas graças obtidas, com o empenho necessário para fazer a data
jubilar não passar em branco e grupos folclóricos, em especial de
bumba-meu-boi, generosamente se apresentaram na frente da igreja em louvor a
Deus pela mercê de São João.
Nas fogueiras acessas neste dia na Ilha do
Amor, para os que as tomam por testemunhas de supremas verdades, fica o clarão
de uma certeza de fé e convicção: o tempo sempre se encarrega de ratificar
aquilo que merece sê-lo.
A história é o povo quem faz e o que
atravessa gerações merece respeito e tem valor. Ontem e hoje, as gerações
passadas, no plano do invisível, e as presentes, no plano da visibilidade, há
350 anos unidas proclamam: Viva São João!
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