Conta uma lenda antiga, cuja fama
pelos tempos modernos inda voa,
que lá no inferno, condenado à toa,
de fome e sede Tântalo rebrama.
Junto, corre uma fonte clara e boa.
Perto, um galho de frutas se recama.
Mas, se ele quer comer, se afasta a rama,
e, se tenta beber, a água se escoa.
Tem minha vida e a lenda o mesmo traço,
flagela-me também um vão desejo,
fome e sede incontidas também passo.
Punido como Tântalo me vejo:
Tão perto desse corpo, e não te abraço!
Tão junto dessa boca, e não te beijo!
Esta beleza de poema é de Mata Roma: um dos grandes poetas do Maranhão. Alguns críticos consideram o soneto acima como um dos mais belos da literatura nacional.
José Mata Roma nasceu em Chapadinha-MA e era vaqueiro, contudo ao entrar em contato com as letras delas não mais se apartou, deixando o ofício de vaqueiro para tornar-se exímio professor e imortal da Academia Maranhense de Letras.
Mata Roma era um homem de espirito jovem, mas austero, conforme determinava a sociedade da primeira metade do século passado. Conta-se que esse erudito morria de amores por uma bela jovem, com quem não lhe era lícito casar, entre outras coisas pela diferença de idade entre ambos e pelo fato de que o divórcio não existia e os casamentos só tinham fim através da morte de um dos cônjuges.
Especula-se sobre o fato de Mata Roma ter mantido ou não uma relação amorosa extraconjugal com a jovem. Fato é que, ao que tudo indica, a moça que inspirou o poema Tântalo fosse talvez uma aluna sua, o que naquela epóca tornava ainda mais dificultoso que a sociedade aceitasse um romance entre os dois e, sendo assim, ao poeta cabia apenas sofrer e sofrer, em silêncio, essa angustia de amar e não poder se declarar.
Assim surgiu o soneto Tântalo e, ao menos parece, após esta radiografia poética, a beleza dos versos ganha maior relevo e faz que quem o lê senta e compreenda a angustia existente em cada verso. Se bem verdade que o poeta é um fingidor, como disse Fernando Pessoa em um de seus poemas, não fica dificil compreender porque quando o poeta põe no poema sua experiência própria - deixando o fingimento de lado - o resultado beira o esplêndido.
A amante dos sonhos do poeta soubera o tamanho do bem-querer que este lhe nutria? talvez sim, talvez não. Essa resposta o poeta levou ao túmulo. O certo é que como dizia Camões "o canto é maior que a razão", e que a amante do poeta, ao menos nos devaneios deste, fora talvez uma das mulheres mais amadas de sua epóca, amada com um "fogo que arde e não se vê", nesse "contentamento descontente".
Na minha pequenez, longe de igualar-me a Mata Roma também arrisco meus versos, mas a radiografia deles reservo-me para além túmulo. Que viva o canto e o meu é amoroso e tímido, tão tímido como eu.
Quero-te mas não posso ter-te. Não posso...
Pois falta-me coragem para te dizer
Que quero em meus braços o carinho vosso!
Ainda que me fosse a coragem amiga
O hoje não permitiria eu viver
No calor de teus braços, lábios... Seios!
Se é para arriscar-me dizer-te e não ter-te
Como mulher. Prefiro ter-te assim...
Como menina, ou quem sabe amiga
Pois para viver sem o teu sorriso
É melhor desistir antes do fim
Ficar calado em sonhos... Anseios!
Pois neles tenho-te sempre comigo
Até o dia em que olhes para mim!
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