Algumas datas são magnas pelo que
significam. A significância é algo que entrelaça o racional e o emocional, na
síntese de um sentimento maior que, por vezes, se transubstancia na sinonímia,
intangível, de uma emoção que floresce na divisa de antônimos para conceber
algo superior aos mesmos.
Em 30 de março de 1920, a antiga Vila de
Santo Inácio do Pinheiro foi elevada à categoria de cidade sob a denominação de
Cidade de Pinheiro, em homenagem ao capitão-mor lusitano Inácio José Pinheiro
que, em 1806, demarcou – nas terras onde depois se erigiu aquela antiga vila –
uma sesmaria de índios por ele batizada de “Lugar do Pinheiro”.
Pensar 30 de março de 1920 é mergulhar
no tempo e meditar sobre os primórdios dos fatos que convergiram para o mesmo e
compromissar-se, pois pinheirense de coração traz n’alma uma saudade do porvir
e vivencia no presente – com as inúmeras possibilidades que florescem ao
caminhar das horas – a sutileza de um compromisso enérgico: amar Pinheiro!
Após 95 anos daquela data magna,
suspiros de antanho e antífonas de futuro evocam, no transpor destes últimos
dias de março, sob os murmúrios dos “mansos ventos da chapada na cabeleira do
babaçual”, uma história cheia daquela simplicidade bucólica que, ao mesmo tempo,
paramenta-lhe com a majestade da realeza e coroa-lhe com a fidalguia da nobreza
pungente e inata na brava gente pinheirense.
No veio das águas do Pericumã, o
presente se espelha, em meio ao torpor da emoção que nasce da recordação dos dias
idos e deságua na criação do município de Pinheiro, na sua emancipação política
e no seu paulatino progresso social e econômico... Um sopro de desalento
açoita-lhe a face e evidencia em seu redor uma realidade não tão bela: nem tudo
são flores!
A constatação de que os verdes campos do
Pericumã já não são tão verdes; as curacangas que outrora reinavam soberanas
pelas noites nas ruas pacatas, deram lugar aos criminosos de toda espécie que
assassinam o sossego e a paz pública; o novo se sobrepôs ao velho, sem dó e nem
piedade, aniquilando-lhe quase todos os vestígios; a desigualdade social
qualificada de egoísmo está sufocando a fraternidade, que nasce da consideração
que antes nutria o povo pinheirense; o futuro está sendo assassinado antes de
ser concebido; o babaçual já quase não tem mais babaçu e na Faveira, enfim, há
de tudo, menos favas... Uma lágrima de tristeza, orvalhada da alma sentida,
brota nos olhos do presente e se esvai até unir-se com as águas do Pericumã
tornando-se imensa como ele, precipitando-se no mar.
Para não dizer que não falei das flores,
chamo à baila a alegria de algumas constatações deveras salutares: a instalação
de campus universitário e cursos
superiores como, por exemplo, o de medicina, porém, neste caso específico, este
sentimento implica reconhecer outra constatação que lhe diminui o gozo: o fato
do número de pinheirenses ocupando as vagas do referido curso ser irrisório. Amarga
evidência que assinala algo que não está bem!
Todavia, a vida prossegue e felizmente
ainda oportuniza ouvir-se o ritmo sinfônico do tambor de crioula, o toque
cadenciado das caixeiras do divino e o dobrado dos sinos da Matriz a ecoar no
âmago do ser. É que, para quem ama, o tempo é um estar e ser o que será – em
meio ao que foi – nas construções do agora e do amanhã. Portanto, amar Pinheiro é tributar-lhe lugar
cativo no peito devotando-lhe um bem querer que doa sem interesse, gosta sem
explicação e ama com o inexplicável amor que move céus e terra e atravessa
mares.
Quem ama cuida! Fica a advertência e a
exortação para que nos próximos “trinta de março” possamos nas águas do
Pericumã espelharmo-nos, para submergir no passado e antever um futuro, deveras
promissor, em meio a um presente venturoso que reafirme a certeza de que é
impossível amar Pinheiro sem cuidar de seus campos, de sua flora, de sua fauna,
de sua história e de sua gente aguerrida por opção, boa por natureza e única
pela sua consideração.
Ave Pinheiro, Jóia do Pericumã.
Marchemos ao centenário, com fé e amor. Que a esperança se transforme em
alegrias imensas, duradouras e repletas de luz!
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